LITERATURA > 1_Contos_C > 2_Julia Blinder_C > Julia_2021_C
LITERATURA > Contos
Publicado em 16 de abril de 2021
Julia Blinder
Vindo da Argentina a contar contos no Brasil
* * * * * *
As taças de conhaque
Essas
taças eu as herdei do meu pai.
Tenho várias lembranças a elas ligadas.
Mas, o que me levou a escolhê-las, foi uma que tenho de quando eu era
bem pequena. Devia ter uns 4 ou 5 anos, como meu pai viajava muito passava vários
dias longe de casa. Eu estava ansiosa pela sua chegada, não porque ele me
trouxesse presentes, mas porque eu adorava sentar no seu colo e assistir boxe
nas noites de sexta e aos sábados à tarde, o Show de Carlinhos Balá.
Mas, às sextas-feiras, enquanto minha mãe preparava o jantar, dos adultos, já que eu jantava mais cedo, meu pai ia ao aparador da sala de jantar, abria a portinha onde guardava as taças e o conhaque, e iniciava aquela rotina que gravei na minha memória.
Ele tirava a taça, um aquecedor especial, acendia o fogo, servia o conhaque e, enquanto aquela bebida cor de mel esquentava, preparava seu cachimbo preferido, aquele que dei para ele no Dia dos Pais.
Enquanto ele preparava tudo, para desfrutar de seu esporte favorito, eu o observava como se ele fosse um mágico preparando sua poderosa poção. E sonhei que quando crescesse usaria aqueles óculos, e me imaginei vestida com saia longa, fumando com aquelas piteiras compridas e uma grande estola de penas.
Hoje, fecho os olhos e posso sentir aquela mesma emoção, aquele cheiro a chocolate do tabaco e o cheiro do conhaque morno, e ouço a voz do meu pai a dizer-me:
- Vamos Sapinho, vem cá, a luta já está começando.